Passei por uma época, não muito tempo atrás, em que eu achava que tudo estava perdido na minha vida e que eu não conseguiria mais continuar vivendo.
Eu fui criada numa família bastante normal. Minha mãe era católica e nos criou na fé. Eu era muito ligada à família, tinha grandes amigos e uma vida escolar feliz. Minha fé era sólida, assim como o meu senso moral, o que me mantinha firme e com os pés no chão enquanto eu ia me tornando adulta. Em outras palavras, a minha vida era boa.
Fui para o Peru depois do ensino médio e morei com algumas freiras numa favela da periferia de Lima, onde trabalhava como missionária na comunidade. Foi uma experiência fantástica. Eu ia à missa diariamente, o que aprofundou ainda mais a minha fé. Mas… Faltava algo fundamental que, na época, eu nem percebia que faltava.
Eu também estudava filosofia na universidade. Uma filosofia muito laica, aliás. Tenho vergonha de dizer, por exemplo, que, em três anos inteiros, a noção de “Deus” mal foi mencionada em uma única oportunidade. Eles nos ensinaram a filosofia grega antiga, pularam a totalidade dos períodos patrístico e medieval (ou seja, nada de Agostinho nem de Tomás de Aquino, nem de muitos outros grandes pensadores católicos que são marcos na história do pensamento) e foram direto para a filosofia moderna e contemporânea.
Estudando essa filosofia laica e vivendo imersa num ambiente laico (além de ter o meu quinhão de diversão universitária “selvagem”), comecei a sofrer o declínio gradual da minha fé. Eu nunca renunciei à fé, nem sequer diante de mim mesma, mas, no fundo do meu coração, eu não acreditava mais.
O principal problema foi a minha arrogância. Em meu orgulho egoísta, eu me colocava, com a minha própria capacidade racional, no lugar deDeus, no centro da minha existência, como juíza e jurada. Lentamente, fui me fechando à graça de Deus.
Enquanto eu passava por essa crise de fé, que ocupava quase toda a atenção dos meus pensamentos, a minha vida desmoronou. Vivi um trauma terrível, que durou muitos anos. No início dessa época árdua, eu estava morando em Londres, sem dinheiro, sem emprego, sem amigos, em circunstâncias familiares terríveis, me sentindo completamente sozinha no mundo e descobrindo que eu não tinha fé nem esperança para me apoiar. Eu ia à igreja, mas não sentia nada quando recebia a Eucaristia; me sentia morta por dentro e entrei num estado de total desespero.
Eu passava dias a fio trancada em casa, não me vestia, mal dizia uma palavra e bebia álcool em grandes quantidades. Simplesmente não enxergava nenhum caminho para trilhar na vida e já tinha desistido de tudo.
Depois de um tempo sem enxergar razões para continuar vivendo, eu consegui pensar: “Chega! Eu quero a minha fé de volta! Eu quero encontrar outros católicos e escapar deste desespero!”.
Foi quando perguntei a mim mesma: “E onde é que estão todos os outros católicos?”. “Bom, o papa está em Roma”, me respondi. “Então eu vou ter que encontrar alguns por lá!”.
Digitei no Google “mestrado em filosofia e ciência em Roma” e um dos primeiros links me levou a um mestrado na Pontifícia Universidade Gregoriana. Depois de uma olhada no conteúdo, resolvi: “É isso”. Arrumei as malas e parti imediatamente para Roma.
Depois de me perder, ser multada em 50 euros no metrô por ter não carimbado a minha passagem corretamente e ser enrolada pelo taxista, encontrei finalmente o albergue que eu tinha reservado para a primeira semana. O albergue era das irmãs de São José, as mesmas freiras com quem eu tinha passado um tempo no Peru. E, para minha surpresa eterna, quem é que estava vivendo em Roma? A mesma madre superiora com quem eu tinha convivido quatro anos antes, nas favelas de Lima, e a quem eu amava profundamente!
“Pois bem, Senhor”, respondi, quando consegui sair do meu espanto inicial. “Estou te ouvindo!”.
Cerca de uma semana depois, conheci uma jovem magnífica, Rebecca, de Chicago, que me convidou a conhecer um centro internacional de jovens que ela frequentava, o Centro San Lorenzo (CSL), fundado por São João Paulo II. Como estava completamente sozinha, eu aceitei com toda a alegria.
Quando cheguei à antiga igreja de pedra, fiquei surpresa ao ver que os bancos não tinham encosto e que os jovens estavam ajoelhados no chão duro, sem qualquer tipo de apoio. Todos se vestiam com sensatez, enquanto eu saracoteava de saia super curta e de top decotado. Para piorar a situação, os jovens oravam de forma espontânea e carismática, sem nenhuma vergonha… Eu até achei que eles eram todos completamente loucos.
Mas fiquei tão atraída pela alegria e pela liberdade deles, e sabia que eu estava tão desesperadamente sozinha, que continuei voltando. Ainda não sentia nada na missa, mas, com a bondade deles, fui aos poucos me sentindo à vontade para participar. Era um começo.
Ao longo do ano, tive altos e baixos na minha fé. No começo, eu ficava procurando sinais de Deus e orando por uma conversão milagrosa. Mas percebi logo que nem sempre é assim que funciona. Para mim, foi uma luta árdua e lenta. Eu tinha muitas dúvidas filosóficas em relação à religião em geral e, acima de tudo, ainda me sentia muito esmagada pelo sofrimento que carregava, depois de tudo o que eu tinha vivido na Inglaterra.
Depois de um ano, descobri uma coisa chamada adoração.
Adoração é quando o Santíssimo Sacramento, ou seja, a hóstia consagrada na missa, é colocada sobre o altar para que todos orem diante dela, reconhecendo nela o Corpo de Cristo.
Eu não sei explicar por quê, mas comecei a participar da adoração.
Pouco tempo depois, o Centro San Lorenzo organizou uma adoração de 24 horas durante o advento e eu decidi participar.
Fiquei lá durante toda a noite, muitas vezes completamente sozinha na igreja escura e silenciosa, com a Hóstia consagrada exposta no ostensório de ouro que brilhava no altar.
Caí de joelhos diante do Santíssimo Sacramento, em desespero absoluto, e supliquei ao Senhor que me ouvisse, que arrancasse um pouco da minha dor, que desse algum sentido à minha vida, que me ouvisse, que falasse, que me mostrasse que Ele estava lá! Que eu não estava sozinha! Eu me sentia tão, tão sozinha que a dor chegava a corroer o meu coração!
Silêncio.
De repente, algo aconteceu.
Pela primeira vez na minha vida, sozinha no meio da noite com Cristo, eu me abandonei completamente a Ele. Meu olhar começou a se levantar de mim mesma, como centro da existência, para Ele, como o novo centro. Meu coração começou a se abrir para Ele.
E, quando o meu coração se abriu, Ele entrou e me preencheu com a Sua presença curadora! Eu percebi que toda a minha dor, amargura e desespero tinham desaparecido completamente e que o meu coração estava cheio apenas de paz, de alegria e de amor. A presença de Cristopermeou todo o meu ser tão suavemente que foi quase sem que eu percebesse; mas o meu coração ardia de amor!
Eu olhava para trás e via os eventos dolorosos dos últimos dois anos, que me causavam dor até física, no estômago. Mas agora não havia mais dor nenhuma. Nem ódio. Nem raiva. Só amor, transbordando, ilimitado, imparável!
Cristo estava em mim! Ele morava dentro de mim, em carne e osso, me trazendo para a vida, para a vida verdadeira! Cristo estava na Eucaristia!
Eu podia ver o Seu corpo no altar, na hóstia consagrada. Ele estava diante de mim, em carne e osso. Eu O encontrei fisicamente! Meu Senhor, meu amigo, meu mestre, meu Salvador e meu Deus! Ele estava bem ali na minha frente, eu O via com os olhos do meu coração, transformando a minha vista cansada, que antes não enxergava nenhum sentido num mundo duro e cruel… Agora eu via a realidade diante de mim repleta de sentido Divino, a bela criação de Deus se desdobrando diante dos meus olhos e apontando para Ele, para o Filho de Deus.
Ele transformou o meu coração partido e de pedra num coração de carne, feliz por estar batendo!
Eu queria gritar aos quatro ventos: “Jesus está vivo! JESUS É REAL! Ele está aqui de verdade, na carne, na hóstia! E eu O amo!”.
Voltei para a Inglaterra naquele Natal e contei a minha experiência a quem quisesse ouvir – e a quem não quisesse também. Meus amigos e familiares acharam que eu estava fora de mim, mas aquele encontro com o Amor curador tinha feito o meu coração transbordar e eu não podia deixar de compartilhá-lo com quem me rodeava!
Eu queria falar a todos do novo Amigo que eu tinha feito, da presença real do Corpo de Cristo na Eucaristia, de como Ele tinha me dado a vida de volta, ou me trazido para uma vida nova!
Cresceu em mim uma fome insaciável de Deus! Eu queria descobrir mais sobre a minha fé. Comecei a frequentar a missa diária, a fazer adoração e saí às ruas para evangelizar.
A missa se transformou para mim. Ela já não era algo a que eu apenas assistia, mas algo de que eu participava. Não eram apenas palavras secas e abstratas: era a Palavra de Deus, a presença de Deus. Eu recebia o Corpo e o Sangue de Cristo, participava do Seu sacrifício, da Sua morte na cruz, da Sua ressurreição.
O Corpo e o Sangue de Cristo! Era isto o que tinha me faltado a minha vida toda! Era a comunhão com a carne de Cristo, o meu corpo encontrando o dele, um encontro real e concreto entre mim e Cristo, que levantou a minha vida, miserável, solitária e despedaçada, até a vida feliz, radiante e gloriosa nele.
Carly Andrews
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